sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Cômodos

Levantei-me devagar, sentindo uma pressão fora do comum de cima para baixo. Era o peso da minha cabeça, ainda sob o efeito de algum tipo de bebida do qual eu mal poderia me lembrar. E nem queria. Tentei olhar para a janela, querendo ter alguma idéia de que horas seriam, mas o feixe de luz que vinha dela - por menor que fosse - fez arder minhas pupilas.
Por alguns segundos enxerguei o quarto como por trás de um vidro fosco, meus olhos. “Onde eu estava com a cabeça?” Foi o primeiro pensamento que atravessou minha mente, quase como um vulto. E senti mais uma vez o peso da minha cabeça, quando tentei levantar sem forças. Andei sozinha pelos cômodos, parando em cada canto do corredor. Tentando fazer emergir qualquer razão convincente pela qual não havia ninguém naquela casa. Apenas eu. Involuntariamente fui fazer algum café. Café esse que sempre sobrava. E que eu insistia em fazer a exata quantidade - ao menos para duas pessoas - caso eu tivesse que dividir em algum momento. “Que ilusão boba!” Pensei de imediato, enquanto jogava fora o resto do café anterior. Como de costume. Houve dias em que eu perdi a esperança por completo. Não havia mais nada ali, nada além de paredes com a pintura descascada, louça empoeirada sem uso, alguns discos velhos e livros cheirando a mofo. Ah, e é claro; uma alminha pequena e miserável. Fraca, e sem motivos mais para crer. Incapaz de ser como aqueles independentes e se curar sozinho, espantar sua dor; fazendo nascer em si um novo eu, renovado e limpo. Mas tem algo de incabível na frase “A vida continua”. Porque ela continua sim, mas seu aspecto é de morte, de perda e de abismo. De certo que ainda me resta um resíduo de sentimento, que sai de mim e atravessa essas paredes frias. Algo que persiste e cala toda a dor escondida por trás de cada móvel da casa. E me remete aqueles dias e noites em que fui inteira, em que aquele amor – por falta de um nome mais absoluto - encheu a mim e a esta casa de uma brisa leve e refrescante; como uma noite de verão. Onde tudo era mais confortável. Sentar no sofá para assistir televisão no domingo tinha outro aspecto. Entre braços que entrelaçavam tudo em mim, me deixando sem ar. Sufocando-me de uma harmonia contagiosa. Sei que ainda há vestígios em tudo aqui, eu apenas não consigo os encontrar. Eu nunca me vi numa posição de vítima, nem de fraca, acredite. Eu apenas acabei sendo colocada nessa categoria, acidentalmente. Creio que me apego a essas, como sendo minhas últimas palavras a respeito, pois toda persistência merece um ponto final. Eu poderia jurar que nunca usaria “Ponto final” me referindo a tudo que eu vivi antes, quase uma outra vida. Mas sinceramente, o ceticismo virou uma realidade amarga durante todos esses meses. Sempre achei que mentir pra si mesmo era insanidade e não funcionava. Mas agora soa como um bom começo, ou até mesmo uma escada para o triunfal escape, do abismo em que fui jogada. “Quem sabe a felicidade não é um conformismo vindo de uma mentira contada muitas vezes?” Mas para começar um desapego das minhas idéias, é necessário de início; crer. E no mais, escolher crer, pois entendi que é tudo basicamente uma questão de escolha, e claro; de se convencer daquilo que se quer crer. Mesmo que soe como uma mentira no começo. “É, acho que farei mais um pouco de café, dessa vez”. Sussurrei entre pensamentos rotineiros. E o dia passou, como de costume.

Juliana Lima

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